Essas férias foram mais curtas, tínhamos apenas 15 dias para rodar. O Conrado estudou vários roteiros, mas um dos mais atraentes para um espaço de tempo tão curto (não dá para ir muito longe) são os Valles Calchaquíes, no noroeste da Argentina. Já havíamos passado por uma parte dele na viagem de 2006, mas muitas das belezas foram injustamente ofuscadas pela experiência surreal de cruzar o Paso San Francisco. Assim, voltamos com mais calma a um lugar que tinha deixado ótimas lembranças. Como não deu para ver tudo ainda por causa da chuva, teremos que fazer o "sacrifício" de voltar lá novamente. Dessa vez o Conrado foi de BMW R1200GS Adventure e eu de BMW F650GS (achei a moto da minha vida, estou encantada). Encontramos surpresas maravilhosas, inesperadas para uma viagem tão curta. Vem com a gente dar uma voltinha!

2008 • Valles Calchaquíes


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Finca em Cafayate, Argentina • janeiro 2009


[22—23 dez 2008] Santa Fé, Jésus Maria

Santa Fé é uma cidade fundada no século XVI e cheia de construções históricas. Dá a impressao que o lugar renderia uns bons dias de exploração, pena que a gente teve que ir embora logo cedo. No caminho a gente passa também por um município chamado Paraná — da estrada dá para ver a skyline e parece muito lindo. Para cruzar o rio Paraná a gente atravessa um túnel de quase 3 km e depois ainda tem umas pontes.

Encontramos na estrada uma família com 3 gerações viajando de carro. Pediram dicas de hotel num posto de gasolina e acabamos nos encontrando lá. As duas avós (uma de 70 e outra de 80) eram umas fofas e ficaram fascinadas com a minha moto, uma delas até tirou fotos nela. Aliás, nas paradas vejo que as velhinhas olham encantadas para a minha supermáquina — acho que elas queriam dar uma voltinha. E não é para menos, ela é tudo de ótimo mesmo!

A viagem até Jésus Maria (perto de Córdoba, que evitamos por ser muito grande) foi bem tranquila e bem menos cansativa. É que entre Santa Fé e Córdoba (duas capitais de provínicia) há dois caminhos principais: uma autopista duplicada e uma estrada antiga. Obviamente escolhemos a Ruta 19, que passa pelo meio de mais de uma dúzia de cidadezinhas. Tem de tudo, umas muito charmosas e outras um pouco assustadoras. Vi a Farmácia “La Picada” e “O Limpio” Produtos de Limpeza.

Uma das coisas que mais me encantam nos argentinos é a auto-estima em ótima forma sem sombra de falsa modéstia (eu me identifico muito...eheheh..). Vê se não é o máximo essa placa na entrada do vilarejo de Dean Funes, que tem o slogan “El mejor lugar...”. Será que essas reticências são para completar a frase com “...não é aqui!”?

Na estrada deu até para me embrenhar numa plantação de girassol, olha só que lindo!


[24—25 dez 2008] Tafí del Valle

Saímos de Jesús Maria com chuva, mas, apesar do mau tempo, o dia estava lindo. O céu azul marinho fez as estradas parecerem ainda mais surreais. Rodamos mais de 540 km sem encontrar nada, só a estrada perfeita e um cenário de filme. A mais ou menos 50 km de Tafí, começamos a subir a montanha que nos leva à cidade. São 2.000 m de altitude, no meio da mata fechada e cheia de cachoeiras. Apesar de asfaltado, o caminho é bem estreito (em alguns pontos só passa um carro) e há uma profusão de curvas em cotovelo. Pena que estava chovendo, o cenário estava primoroso… levamos quase uma hora para subir, mas valeu muito a pena.

Finalmente chegamos ao paraíso (logo depois do fim do mundo, como se pode ver na foto da estrada). Tafí del Valle é uma graça, cheia de lojinhas de artesanato, restaurantes bacanas e pousadas charmosas. Ficamos numa pousada construída há 200 anos (está na família há 9 gerações e a maioria dos móveis é original). Como se isso não fosse suficiente, há um labrador fofo e querido chamado Tato e uma gata manhosa toda malhada chamada Durabica, além de 3 lhamas que vivem tomando sol no gramado.

Lá é friozinho e os quartos tem calefação. A estância tem uma biblioteca maravilhosa cheia de livros que ficam à disposição dos hóspedes. O Conrado e eu até aventamos a possibilidade de mandar trazer os gatos e os computadores e ficar morando lá mesmo…eheheh…

Tafí del Valle já foi povoado por diversas tribos indígenas, inclusive incas. No século XVIII, os jesuítas adquiriram as terras e se estabeleceram lá. Em 1767 eles foram expulsos, e a região foi dividida entre as 4 famílias mais influentes, que constituíram as estâncias, uma das quais é Los Cuartos. Dá para visitar a fábrica de queijos da estância, uma produção bem artesanal e deliciosa…


[26 dez 2008] Rumo a Cafayate

Saímos de Los Cuartos rumo a Cafayate (130 km). Cruzamos a pré-cordilheira (3.000 m de altitude) e o caminho era lindo, todo sinuoso, com vistas de tirar o fôlego. A estrada estava bem ruim, mas como o movimento era pouco, dava para escolher cair nos buracos menores … eheheh … os poucos trechos de rípio eram melhores que os de asfalto.

Quando o asfalto melhorou, já no vale entre a pré e a Cordilheira, em Amaichá, a estrada ficou com vários “riozinhos” — deve ter chovido bastante. Perdemos a conta, mas eram certamente mais de uma dúzia. A travessia era divertida, mas a gente se molhava muito! O perigo era a lama que se formava, pois faz a moto escorregar.


Bó Hotel de Encanto

O é encantador não só pela casa em si, mas principalmente pelos seus anfitriões. Roxana é peruana, filha de uma diplomata argentina que estudou Design de interiores em Londres e já morou em vários países do mundo. Tony Street é um arquiteto que se define como meio inglês, meio francês. Ele é um ex-executivo da Airbus que já teve agência de propaganda na Espanha, restaurante na França e negócios nos Estados Unidos. Juntos eles se cansaram de dar a volta ao mundo e resolveram construir o hotel onde gostariam de se hospedar. Anfitriões de primeiríssima, cozinham pessoalmente para os hóspedes com capricho e têm um papo irresistível pela quantidade de histórias legais. Eles se desdobram para realmente encantar os clientes...

Gostamos tanto do lugar que mudamos os nossos planos de volta. Cortamos Corrientes do roteiro e ficamos mais um dia nessa pousada maravilhosa (acabamos ficando 3 dias). O Tony nos levou para conhecer um pomar com mais de mil árvores de 200 tipos diferentes de frutas em uma fazenda de fumo (Chicoana vive basicamente da plantação de fumo). A propriedade tem mais de 400 anos e a sede é belíssima!

Depois eu fiz um curso rápido de gastronomia saltenha (Chicoana fica na Província de Salta). É que todo ano tem um concurso na cidade para ver quem faz as melhores empanadas, e a mãe da Patricia ganhou todas até hoje (tem dúzias de troféus e placas) e por isso é chamada de “Rainha da Empanada“. A Patricia só tem 16 anos, e como a mãe está doente, é ela quem faz as empanadas agora (por isso, chamamo-la de ”Princesa da Empanada“). A Roxana contratou a Patrícia para me dar uma aula, foi muito legal. Quando nos reunimos todos para comer aquelas delícias (foram as melhores empanadas que já comi), elas me fizeram uma surpresa: ganhei um diploma de “Condessa da Empanada Saltenha“…ahahah!!!

Depois ainda a Patricia me levou para conhecer uma trilha no sopé da montanha em um lugar chamado Quebrada de Tilián (3 horas de caminhada) e ainda me deu umas aulas de espanhol! Muito legal mesmo. Eles são todos uns amores, o Tony até fez um lanchinho para a gente levar de manhã no dia em que fomos embora!


[27—28 dez 2008] Cafayate

Cafayate é uma gracinha, ainda mais linda que Tafí. A cidade tem somente 12 mil habitantes e foi fundada em 1640. A economia é baseada principalmente na produção de vinho, o que faz o lugar ficar muito interessante. Dá para dizer que há quatro “bodegas del viño” em cada esquina — são daqui as famosas uvas Torrontés, somente cultivadas em altitude (Cafayate fica a 1.700 m). Deve ser legal vir em maio, quando ocorre a vindimia (colheita da uva). Há pelo menos uma dúzia de fincas (vinícolas) em volta da cidade. Chato, né?

Se alguém for visitar Cafyate algum dia, não deixe de experimentar o sorvete de vinho torrontés, é divino (e muito alcoólico — não devem vender para crianças). A invenção foi patenteada pelo sr. Miranda, dono da sorveteria mais famosa da cidade e que também é artista (suas obras estão expostas no estabelecimento).

A comida é ótima e os vinhos dispensam comentários…


[28 dez 2007] Quebrada de las Conchas

Entre Cafayate e Chicoana (nosso próximo destino), há a Quebrada de las Conchas, também chamada de Quebrada de Cafayate. É muito lindo mesmo, cheio de esculturas naturais em pedra. No caminho a gente parou para tomar água na venda da Tia Domingas. A velhinha, muito simpática, ficou encantada com a minha moto. Deu até vontade de convidá-la para dar uma voltinha (acho que ela topava!). Olha só que cenário de filme!


[28—30 dez 2008] Chicoana

Viemos a Chicoana (perto de Salta) com a intenção de conhecer a Cuesta del Obispo, a subida para uma montanha com mais de 3 mil metros de altitude. Lá no alto fica a cidadezinha de Cachí. Só que não parou de chover, então ficamos descansando no Bó Hotel de Encanto e resolvemos deixar o passeio para outra ocasião.

Gente, esse hotel é um capítulo à parte na viagem. É uma casa de 150 anos que foi totalmente reformada (sao apenas 6 quartos, todos diferentes). Parece uma Casa Cor; além de lindos, com piscina e jardins, os ambientes têm um monte de livros e revistas de decoração, além de uma biblioteca variada e um home theater.


Atalho radical

Saímos de Chicoana mais tarde do que planejamos (o papo no café da manhã estava bom demais). Para não ter que entrar em Salta e pegar trânsito, resolvemos cortar caminho por uma estrada sem calçamento. Uns canadenses que chegaram enquanto jantávamos disseram que não tinha lama nenhuma (nossa maior preocupação), então nos mandamos.

A paisagem era das mais sensacionais que eu já vi (a montanha contornava a represa Cabra Corral), mas a estrada era de um rípio ruim de doer, fora os vários riozinhos que atravessamos. Curvinhas fechadas e íngremes lindamente adornadas por milhares de pedrinhas soltas e areia fina fizeram a gente suar… as motos ficam enlouquecidas com essas pedrinhas (de todos os tamanhos) e querem sair sambando — é preciso ter pulso firme para a coisa não virar bagunça — mesmo assim eu caí 3 vezes …

Resumo da ópera: levamos mais de 2 horas para andar 60 km — era quase meio dia quando chegamos exaustos ao asfalto e ainda tinha mais 650 km para encarar. A sorte é que o asfalto virou brincadeira de criança depois daquilo. Deu para manter 150 km/h porque a estrada estava absolutamente deserta (exceto por numerosas famílias de cavalos, vacas, pássaros, borboletas, cabras, ovelhas, burricos e até porcos que usavam a pista e as imediações para suas reuniões sociais). Não passamos nenhum susto porque a região do Chaco é toda reta (a estrada quase não tem curvas) e a vegetação é bem baixa — a visibilidade é de uns 20 km — assim, dava para saber com bastante antecedência onde estavam bombando as festas animais! Chegamos cansadíssimos às 20h30 ao hotel de beira de estrada de Machagai (aqui anoitece às 21h30) — foi só o tempo de comprar umas empanadas (ótimas) na padaria da cidade, tomar um lanchinho e passar o 31 de dezembro dormindo o sono dos justos.


Retorno

Chegamos em Floripa no sábado, dia 3 de janeiro, sendo que os últimos 300 km foram de muito vento, frio, chuva e malucos no trânsito.

É bom demais poder viajar de moto nas férias, virou um vício. Além de funcionar como lua de mel anual, viajar por horas sem falar, em lugares vazios e com paisagens sensacionais é uma ótima oportunidade para repensar a vida, nossos valores e prioridades. A gente volta cansado, mas cheio de gás e muitos planos! Para onde será que vamos no ano que vem?


[19—21 dez 2008] Florianópolis, Lages, São Borja 

Colocamos em prática novamente a técnica de sair de viagem “de véspera” — é que teríamos que acordar cedo demais no dia 20 para preparar as motos e verificar os detalhes, além do que, pegar 850 km no primeiro dia é um pouco puxado demais (estamos de férias!). Assim, saímos na sexta à tarde com toda a calma e a viagem para valer só começou no sábado. Escolhemos sair do Brasil pela aduana de São Borja, no oeste do Rio Grande do Sul, porque é o caminho mais curto.

Esse trecho foi bem tranqüilo, conhecemos algumas pessoas bem interessantes no caminho e deu para me familiarizar mais com a moto (só tinha feito viagens curtas com ela porque a chuva que se abateu sobre o Estado no segundo semestre inviabilizou roteiros mais longos). Ela é maravilhosa, recomendo com louvor. O único porém é que o banco da Falcon era tão macio que eu tinha até aposentado a minha almofadinha. Nessa viagem senti uma falta danada, meu bumbum foi muito castigado, coitado. Vou ressuscitar a almofada, não vai ter jeito mesmo — uma moto tão maravilhosa com um banco tão duro...

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Viagens

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2009 • El Calafate
2009 • Laguna Pozuelos
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