[21—23 dez 2007] Florianópolis, Lages, Maravilha, Corrientes

Escolhemos sair do Brasil pela aduana de Dionísio Cerqueira, no oeste de Santa Catarina, porque é perto de Maravilha, cidade onde fomos visitar uma amiga querida que ia se casar. Para o trecho não ficar comprido demais no primeiro dia, saímos de Floripa dia 21 à tarde e só fomos até Lages. Dia 22 seguimos para Maravilha e dia 23 atravessamos a fronteira. Foi só entrar na Argentina para que todos aqueles motoristas nervosos, audazes e insanos, simplesmente desaparecessem de vista. O mundo se esvaziou de repente e as estradas ficaram só para nós. Delícia! Sem dizer os tipos que a gente encontrou no caminho.

Nesse trecho, até milagres aconteceram! O zíper da bolsa na garupa da minha moto abriu sozinha e cuspiu a máquina fotográfica novinha na estrada, e eu nem percebi. Chegando num posto é que me dei conta. Lá foi Conrado, meu super-herói atrás do equipamento perdido. E voltou com ela! A coitada caiu quando passei por uma lombada, na entrada da cidade de Eldorado. Um senhor viu e juntou — quando o Conrado passou, ele logo acenou com a câmera na mão. Ainda por cima, estava funcionando (benditas capinhas acolchoadas…). Que coisa, né? Nada como levar anjos de guarda na garupa.


[3 jan 2008] Rumo à Iquique

Saímos de manhã de San Pedro de Atacama com o objetivo de cruzar todo o deserto até bater na praia. Mais especificamente na cidade de Tocopilla, que nunca mais vou esquecer. De lá, a gente pretendia subir pela costa litorânea até Iquique (uns 250 km beirando o mar). Pretendia…

Para se ter uma idéia, Tocopilla faz San Antonio de los Cobres parecer New York. Visualize: uma planta industrial de beneficiamento de minério, um porto e algumas minas abandonadas, tudo isso permeado por um favelão. Essa é Tocopilla! Chegando no posto da cidade, descobrimos que a estrada da costa estava sendo dinamitada (tinha sofrido danos no terremoto de novembro e aproveitaram para fazer uma ampliação) e só abriria para circulação às sete da noite (era meio-dia quando chegamos).

Ante a possibilidade de passar tantas horas naquele lugar sinistro, demos meia-volta e picamos a mula. Nossos 500 km acabaram virando 700 km por causa dessa visita, digamos assim, turística. Mesmo assim, valeu o passeio pelo deserto ...

Esse ano viajamos somente o Conrado e eu, cada um na sua moto. Ele, de BMW R1200GS Adventure e eu de Honda Falcon NX4. Saímos de Florianópolis e cruzamos o continente, rumo ao Oceano Pacífico. Eu nunca tinha feito uma viagem tão longa pilotando, e só posso dizer que esse negócio vicia. Como as boas coisas da vida, cansa bastante, mas é ótimo! Vem com a gente dar uma voltinha!

2007 • Iquique


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Paso de Jama, Argentina • janeiro 2008


[24—27 dez 2007] Salta La Linda

Foi difícil conseguir lugar para jantar na véspera de natal. Passamos 3 dias na cidade, que, não à toa, é conhecida como "Salta La Linda".

Como dia 25 estava absolutamente tudo fechado na cidade, só nos restou descansar (bem que a gente estava precisando). Foi um prazer caminhar por Salta (a alcunha “la linda” é merecida), que é cheia de cafés, restaurantes, parques e construções históricas. Também aproveitamos para trocar o óleo das motos e lavar roupa (estava tudo coberto de barro seco — não sei como o cara do hotel nos aceitou como hóspedes quando chegamos). Salta é uma cidade segura como há muito eu não via. Dia 26 andamos de teleférico (por que não há um em Floripa?) e passeamos bastante. Há um guarda em cada esquina e notamos que aqui o pessoal tem o hábito de namorar a noite nos bancos da praça (aqueles no escurinho). Já pensou que bom se no Brasil também fosse assim?


[30 e 31 dez 2007] Travessia do Paso de Jama

Resolvemos fazer a travessia da Cordilheira em dois dias para não ficar tão cansativo, pois a estrada é íngreme e cheia de curvas. Além disso, há que se considerar a altitude, que chega a 4.830 m no ponto mais alto! Saímos de Purmamarca no dia 30 e dormimos em Susques (3.700 m). As fotos que seguem foram tiradas na ida e na volta.

Se a gente pensar que a Cordilheira dos Andes já esteve debaixo do oceano, dá para duvidar do juízo, né? Mas a prova são as salinas, que levaram milhares de anos para secar e se transformaram em lagoas de sal. Há muitas nos caminhos que percorremos, mas as Salinas Grandes são as maiores (pelo menos é o que parece nos mapas). Como a estrada de leva ao Paso de Jama passa exatamente por cima desse enorme salar, não há como resistir e tirar uma foto. A gente até encontrou um gatinho fofo por lá, num posto de venda de produtos feitos de sal.

Lá no sul, na Patagônia, a Cordilheira dos Andes é como um muro baixo que separa a Argentina do Chile. Conforme vai se aproximando da linha do Equador, ela vai ficando mais alta e se divide em duas. Então, fizemos a primeira parte do “muro” e dormimos no altiplano, que é como se fosse um chapadão bem alto entre as duas partes. Depois, subimos o segundo “muro” e descemos.

O Paso de Jama, nome desse caminho que atravessa a cordilheira, é nada menos que espetacular. Todo asfaltado, bem sinalizado. A primeira parte, na Argentina, é bem sinuosa e íngreme, uma vertigem só! Já a segunda é bem menos acidentada e cheia de subidonas e descidonas praticamente retas. As vicunhas e lhamas estão por toda parte, vimos o vulcão Licancabur (que fica na Bolívia, aqui pertinho) e lagos de degelo indescritíveis.

A chegada em San Pedro é em grande estilo, parece um tobogan. Em poucos quilômetros, a gente desce mais de 2.000 metros. Um caminho que todo mundo deveria passar pelo menos uma vez na vida (mesmo que não seja de moto).


Dia 27 alugamos um carro para conhecer os arredores (é mais fácil para tirar fotos e não precisamos nos preocupar com o horário — de moto a gente não viaja à noite, ainda mais por lugares ermos). Cada nome de empresa que era só para rir mesmo!

Rodamos nada menos que 700 km! Acordamos bem cedo com a intenção de tomar o café da manhã em Campo Quijamo, uma cidadezinha muito charmosa a uns 80 km de Salta. Mas descobrimos uma coisa muito interessante: às 8 da manhã não havia uma panaderia aberta, mas quase todas as carnicerias já estavam a postos. Depois de muitas voltas e sem raciocinar direito (fome!), fomos informados por um passante que a gente tinha que bater na porta da padaria e insistir (!!!) que a dona vinha atender. Conseguimos comprar 4 pães que estavam comemorando um mês de existência e nada de café.

Quer sumir uns tempos? Fugir da civilização? Tenho uma sugestão: San Antonio de los Cobres. É longe e, para não dizer que não tem nada, tem um posto de gasolina (essencial, é o único num raio de 300 km) e duas vendas. Com a fome que a gente estava (depois do lauto café da manhã), os únicos víveres que o Conrado conseguiu foram algumas balas de goma, uma garrafa de água e duas de Gatorade (viva a globalização!).

O caminho foi todo lindo e colorido, como, de resto, tudo nessa região.


[28 dez 2007] Purmamarca

Purmamarca é uma cidade inacreditável. Encravada num vale de montanhas coloridas, é basicamente toda construída em adobe. Sua casas são todas marrom cor de barro, mas quando os artesãos locais apresentam seus produtos, tudo fica bem colorido para combinar com as montanhas da Quebrada de Humahuaca.


[31 dez 2007 a 2 de janeiro de 2008] San Pedro de Atacama

Quando descemos o tobogan que da acesso a San Pedro de Atacama, fiquei seriamente preocupada. Vista de cima, e na entrada, a cidade é horrorosa. Lembra muito San Antonio de Los Cobres e Susques. Ruas de terra, casas de adobe, aparencia de miséria e um sol de deserto. A aduana e a imigração não contribuem para melhorar o cenário com a burocracia infinita, mas logo logo vieram as surpresas boas.

A gente chega ao centro da pequena vila e as casinhas continuam, assim como as ruas de terra. Mas cada porta é uma surpresa: dezenas de cafés bem decorados, restaurantes transados (claro que em estilo rústico), muitas operadoras de turismo com atendimento bastante profissional, pousadas, uma praça muito charmosa e tudo bem organizado. Gente do mundo todo numa babel cosmopolita, tudo funcionando a pleno vapor, mesmo em véspera de feriado. Ah, outra coisa que me chamou atenção foram os vários cachorros lindos e enormes que andam pela rua. Estávamos num café comendo tortillas quando entrou um São Bernardo maior do que eu chamado Pequeño que fez uma festa. Não deu para fotografar porque o bicho não parava quieto, era um furacão. A cidade também é pródiga de gatinhos fofos e abusados.

San Pedro de Atacama não é tão fotogênico como Purmamarca. Sua beleza é menos óbvia, mais discreta. O encanto está dentro das portas, não fora. Mesmo assim, as ruas de terra e as casinhas de adobe não deixam de ter seu encanto. Especialmente porque eles tiveram o cuidado de fazer toda a instalação elétrica subterrânea, o que proporciona uma limpeza visual valiosa.


[6 a 10 jan 2008] A volta desde Iquique

Depois dessa pernada, começamos a voltar. E, como diz o Conrado, basta “embicar” a moto na direção de casa, que a gente logo começa a sentir um elástico puxando. Estávamos muito longe de casa e paramos para dormir em San Pedro de Atacama, Susques, Metán (perto de Salta), Machagai, São Borja, Vacaria e, finalmente, Floripa. Foram quase 7.000 km, chuva, sol, calor e frio, e, principalmente, lugares quase vazios de gente e cheios de bichos.

Dizer que adorei não descreve a emoção. Só posso dizer que no ano que vem tem mais!


[5 jan 2008] Humberstone

Queríamos visitar a cidade fantasma de Humberstone, perto de Iquique, então alugamos um carro (não dá para visitar um museu aberto no meio do deserto com roupa de moto e capacete na mão, né?).

A cidade é fantasma porque foi construída em 1872 para abrigar os funcionários de uma usina de salitre. Em 1960, com a falência do negócios, todos tiveram que abandonar suas casas e o lugar ficou às moscas, inteirinha, com uma infraestrutura de dar inveja a muita cidadezinha boa por aí.

A visita é impressionante: há uma teatro completo, escola para 150 alunos, igreja, praça, padaria, mercado, sapataria, lojas, casas, hospital; tudo para os seus 1.300 habitantes (para se ter uma idéia do porte, San Pedro de Atacama tem 2.000 habitantes hoje), funcionários da mineradora e suas famílias.

É de se pensar onde essa gente toda, que tinha uma estrutura social tão certinha e conhecida, provavelmente tendo morado lá a vida toda, foi parar depois do desmonte. Tudo continua intacto, inclusive os prédios mais antigos e casas, que estão sendo restaurados. A cidade-museu foi declarada Patrimônio Histórico da Humanidade pela UNESCO em 2005.


[23—24 dez 2007] Corrientes, Salta

Dia 24 foi punk! Rodamos nada menos que 850 km em um retão que corta o país como uma régua! A estrada era até bem boa, exceto por uns 50 km onde a gente tinha que escolher o caminho por entre os buracos (mas dava para pensar com calma, a estrada era deserta) e um trecho de 5 km onde o asfalto havia sido retirado para reforma. Pois bem nesse trecho pegamos chuva e vento (ficamos imundos!). Passando pela policia rodoviária da região bem denominada Pampa del Infierno, fomos devidamente extorquidos junto com um gaúcho que estava de carro. Paramos no próximo posto e foi muito engraçado — ao me ver descer da moto, o cara teve que rever os seus conceitos. Ele olhava para mim e para a moto e repetia: “É, mas não pode ser! Não pode ser!”.

Pena que a chuva era muita, senão teria parado para fotografar uma placa que vi no caminho: “Transportes Los que chegam”. Tem nome mais apropriado para uma transportadora?


[3 a 6 jan 2008] Iquique

Iquique, litoral norte do Chile, é surpreendentemente linda! A chegada já é um espetáculo, pois a gente sai de uma curva a uns 1.000 metros de altitude e vê a cidade lá embaixo, lambida pelo mar, com uma duna enorme na frente. Observação: a visão é legal quando se chega de moto — de carro, os guard-rails ficam à altura da janela e estragam tudo.

Por causa da exportação de nitrato durante a guerra, começou a jorrar dinheiro em Iquique. Casas lindas foram construídas, clubes sofisticados, casas de chá, bancos internacionais, e a cidade floresceu. A arquitetura lembra um pouco o velho oeste americano e tem bastante charme. Acontece que lá por meados da segunda guerra, apareceu um alemão invocado e inventou um substituto perfeito para o nitrato… dá para imaginar o baque?

A cidade parece estar se recuperando agora, com várias construções luxuosas em andamento e a restauração da parte antiga, que prima pelo capricho. Eles tiveram a manha de refazer as calçadas totalmente em madeira (uma parte está até envernizada) e as ruas de pedra, ainda com os trilhos do bonde. A cidade é toda colorida, mesmo nos bairros mais pobres da periferia.

A cidade começou pertencendo ao Peru e era apenas uma colônia de pescadores. Com o advento das guerras mundiais, a vila começou a enriquecer por causa das jazidas de nitrato da região (elemento essencial para a fabricação de pólvora), que começaram a ser exportados pelo seu porto. Só que os peruanos não tinham tecnologia nenhuma, as empresas de extração, beneficiamento e transporte eram todas chilenas. A Bolívia tinha Antofogasta, um pouco mais ao sul, e estava na mesma situação. Na guerra do Pacífico, Iquique e Antofogasta passaram a fazer parte do Chile e a Bolívia perdeu sua saída para o mar.

Em Iquique dá para assistir a uma sessão de Animal Planet ao vivo e sem cortes! É só ir ao terminal marítimo de passageiros e presenciar um show de pelicanos e lobos marinhos. Esses últimos mais parecem cachorros se pegando. Os bichos não páram de se cutucar uns aos outros, é uma festa (com som, pois eles ficam conversando em uma língua que parece mais com uma série de arrotos!). A vista do porto também é muito bonita.

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